Diálogo, acolhimento e Justiça: Expedição Araguaia-Xingu promove escuta profunda e transformação
No Distrito de Veranópolis, em Confresa (1.027 km de Cuiabá), a 7ª Expedição Araguaia-Xingu, promovida pelo Poder Judiciário de Mato Grosso, mais uma vez demonstrou que a Justiça é feita não apenas com documentos, mas também através de diálogo, escuta, presença e acolhimento. Entre os serviços considerados essenciais, como emissão de documentos, vacinação, consultas, orientações e atualização eleitoral, dois atendimentos se destacaram pelo impacto direto na vida emocional e social da comunidade: o Círculo de Construção de Paz, realizado pelo Núcleo Gestor da Justiça Restaurativa (NugJur), e as rodas de acolhimento organizadas pela Comissão Estadual Judiciária de Adoção (Ceja).
Em uma área marcada pela distância dos grandes centros e pelos desafios de locomoção, esses encontros criaram um ambiente seguro e com tempo para que as pessoas pudessem compartilhar suas experiências.
Círculos de Construção de Paz
Professores, conselheiros tutelares e crianças da comunidade se reuniram sob a orientação de Áquila Júnio Lopes Machado, gestor do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) em São Félix do Araguaia. Ele conduziu um Círculo de Construção de Paz com foco no autocuidado.
“Neste espaço, trabalhamos o autoconhecimento. Como estou cuidando da minha vida?”, explicou Áquila. Ele ressaltou que, especialmente entre professores e conselheiros tutelares, há uma tendência a priorizar os outros à custa de sua própria saúde emocional. “Estamos sempre preocupados com o trabalho, a família e os problemas da comunidade, esquecendo de cuidar de nós mesmos. A roda permite esse olhar interno”, comentou.
A atividade utilizou a simbologia da roda da medicina, abordando quatro áreas da vida: mental, física, emocional e espiritual. Cada participante refletiu sobre suas necessidades de melhoria e os desafios que enfrentam. Segundo Áquila, a resistência inicial logo se transforma em entusiasmo. “Muitos chegam relutantes, por falta de tempo ou costume, mas todos saem querendo mais. Sempre digo: quem conhece a prática, ama. Pediram até que fizéssemos encontros virtuais.”
Entre os participantes estava Danielle Pereira de Oliveira, professora do 3º ano da Escola Municipal Vereador Valdemiro Nunes de Araújo, que descreveu a experiência como libertadora. “Guardamos muitos sentimentos. O círculo me permitiu expressar emoções e dificuldades. Foi muito importante ser ouvida.”
Adoção Legal e Acolhimento
A Ceja-MT, vinculada à Corregedoria-Geral da Justiça (CGJ-MT), também organizou rodas de acolhimento com professores e conselheiros tutelares. Os encontros trataram de adoção legal, dúvidas comuns, caminhos formais e a relevância da informação para desmistificar e reduzir irregularidades. A assistente social Ivone Moura e a psicóloga Aretuza Wanesa de Deus, da Ceja, destacaram como os profissionais da região lidam com histórias complexas diariamente. “Os conselhos tutelares são a porta de entrada para muitos casos de acolhimento. Recebemos relatos emocionantes de adoções bem-sucedidas e de crianças que passaram anos em instituições,” observaram.
Em uma das rodas, a professora Telma Costa Silva, de 41 anos, expressou seu desejo de adotar uma criança. “Infelizmente, vivemos em um mundo onde crianças são descartadas como objetos. Meu marido e eu queremos adotar, mas isso precisa ser discutido e sentido… não é como entrar em uma loja e comprar uma boneca. É uma grande responsabilidade emocional,” afirmou. Ela também notou a carência emocional dos alunos em sala de aula. “Alguns chegam à escola buscando apenas um abraço. Nós, como educadores, nos tornamos mães, psicólogas e cuidadoras. É muito mais do que simplesmente ensinar conteúdos,” acrescentou.
Para a Ceja-MT, momentos como esses ilustram a importância de levar o tema da adoção a áreas remotas. “Cada comunidade é única. Nosso trabalho consiste em adaptar a orientação à realidade local,” destacou Ivone.
Serviços que Transformam Rotinas
Enquanto o Judiciário oferecia escuta qualificada, a comunidade se beneficiava de uma gama de serviços concentrados. A escola se tornou um polo de cidadania. A moradora Auditânia Pereira Costa, de 36 anos, levou seu filho para vacinar. “Foi muito bom. Não precisei ir ao posto, está tudo aqui.” Enquanto isso, a jovem Isabela Gontijo Lira, de 18 anos, saiu com exame de vista, título eleitoral atualizado e um sorriso de alívio. “Sem a Expedição, teria que ir até Confresa, juntar dinheiro e esperar uma vaga. Aqui foi rápido, organizado e acessível. Não imaginava que o Judiciário oferecia tudo isso em um só lugar.”
O lavrador Domingos Barbosa Barros, de 60 anos, percorreu 10 quilômetros para atualizar documentos e realizar um exame de vista, e ainda aproveitou para cortar o cabelo. “Aqui está ótimo. Se não fosse pela expedição, seria difícil. Uma vez é num lugar, em outra já não fazem… aqui resolveu tudo.”


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